Inversão da Lava Jato: Por que Janot decide segredo de algumas delações?
Advogados e juristas pedem investigação contra delegado da Lava Jato
Marcelo Auler
Na sexta-feira (10/02), com bastante atraso, o delegado da Polícia Federal Marcio Magno Xavier, da Coordenadoria de Assuntos Internos (Coain) da Corregedoria Geral do Departamento de Polícia Federal (COGER/DPF), desembarcou em Curitiba. Levou na bagagem o Inquérito Policial (IPL) 01/2017 que, como o número demonstra, foi instaurado no início deste ano. Magno, na única vez que atendeu ao Blog, por telefone, se recusou a falar qualquer coisa sobre os trabalhos que vem realizando. Apesar disso, sabe-se que, a depender dele, a ingrata missão que cumprirá nos próximos dias teria acontecido no ano passado. Pelo que o Blog apurou, foi barrado por seus superiores.
A partir desta segunda-feira (13/02), Magno ouvirá e indiciará criminalmente agentes e delegados da Operação Lava Jato envolvidos na instalação de um grampo, sem autorização judicial, na cela de Alberto Youssef. O fato ocorreu na custódia da Superintendência Regional do DPF no Paraná (SR/DPF/PR), no dia em que o doleiro foi preso, 17 de março de 2014, início da primeira fase da Operação. A escuta foi descoberta por Youssef no dia 30 do mesmo mês e levada ao conhecimento do juiz Sérgio Moro – que garantiu não tê-la autorizado – no início de abril.
Uma primeira sindicância (04/2014) concluiu que o grampo não estava ativo. Mas, em 4 de maio de 2015, em depoimento ao delegado Mario Renato Castanheira Fanton, o agente de polícia federal Dalmey Fernando Werlang confessou ter instalado, a mando dos seus superiores, não apenas a escuta na cela, como outra no fumódromo da Superintendência. Apesar disso e decorridos quase três anos da instalação do grampo ilegal na custódia d quase dois da confissão de um dos autores, até hoje ninguém foi punido. Antes pelo contrário, sempre que cobrados, polícia, ministério público e juízo evitaram falar do assunto.
A presença de Magno em Curitiba, segundo apurou o Blog, atemoriza muita gente. Curiosamente, ele não encontrará por lá a delegada Erika Mialink Marena, atualmente em Florianópolis (SC), e seu colega Marcio Anselmo Adriano, em missão em Vitória (ES). Os dois faziam parte da cúpula da Força Tarefa da Lava Jato no DPF que está diretamente envolvida ao episódio criminoso. Não à toa que, em março de 2016, Erika, Márcio Anselmo e o também DPF Igor Romário de Paulo recorreram à Justiça Federal de Curitiba para terem acesso à Sindicância 04/2015, presidida pelo delegado Alfredo Junqueira, da Coain. Nesta ação, os três principais delegados da Força Tarefa reclamaram daquilo que costumam fazer com os alvos da chamada maior investigação contra a corrupção no país: o sigilo nos inquéritos, sem que as defesas dos suspeitos tenham acesso ao que está sendo levantado. Consta da inicial da ação por eles ajuizada:
(Os autores) “foram ouvidos na condição de investigados em termo de declarações ao longo do ano de 2015 pelo Delegado ALFREDO JUNQUEIRA. Assim sendo, resta evidente que a natureza singular do procedimento instaurado versa, exatamente, sobre a responsabilidade dos autores quanto à instalação da escuta sem ordem judicial, podendo, inclusive, recair penas administrativas aos mesmos. Contudo, após suas oitivas, o presidente da Sindicância em curso negou aos autores o devido acesso aos autos, argumentando, oralmente, que, devido à visibilidade da causa e a pressão que comumente sofre em casos tais, iria fornecer as cópias somente após a prolação de relatório final. Ou seja, sequer deferiu aos então investigados o direito de apresentarem as defesas necessárias de sorte a colaborar ao entendimento do sindicante.“
Das intenções profissionais do DPF Magno, quem o conhece e à sua trajetória, não levanta qualquer suspeita. Mas, a dúvida surge quando se sabe que ao longo destes quase três anos de Força Tarefa da Lava Jato a cúpula do DPF, com o diretor-geral Leandro Daiello Coimbra e o corregedor-geral, Roberto Mário da Cunha Cordeiro, à frente, jamais tomou providências concretas a partir da sindicância feita por Junqueira, que é tido entre os colegas como “O Ético”.
Antes pelo contrário. Além da confissão de Dalmey, em outubro de 2015 soube-se, como noticiamos em Surgem os áudios da cela do Youssef: são mais de 100 horas, que a perícia do DPF recuperou as conversas captadas entre Youssef e seus companheiros de cela. A informação foi dada, à época, pelo deputado federal Aluísio Mendes Guimarães (PSDC-MA), agente de polícia federal licenciado e um dos parlamentares mais ativos na CPI da Petrobras.
Estranhamente, porém, nem o juiz Sérgio Moro, tampouco os procuradores da República – os quais se orgulham de constitucionalmente serem os fiscais da lei – da Força Tarefa da Lava Jato se empenharam em saber o que continham as gravações. Ou, se o fizeram, jamais tornaram esse conteúdo público. Sabem que a confirmação do grampo levantaria suspeita sobre a regularidade do início das investigações da Lava Jato.
Moro, inclusive, relutou em atender a defesa de um dos diretores da Odebrecht que pediu sua cobrança de explicações à Corregedoria do DPF. Enviado o pedido, na resposta do delegado Cordeiro surgiu a promessa jamais cumprida – assim como, jamais, oficialmente, cobrada pelo juízo – de apresentar o resultado da investigação até o final daquele mês de novembro. Como mostra o ofício ao lado, por nós divulgado em 21 de novembro de 2015: Grampo da Lava Jato: aproxima-se a hora da verdade.
Sérgio Moro relutou em cobrar da Corregedoria do DPF o resultado da sindicância., Foto Ajufe
Por que do IPL? – Apesar da promessa do corregedor, jamais se soube publicamente – o que não o impede de ter se explicado ao juízo – o motivo da demora. No entanto, o que se conseguiu saber é que mesmo com a sindicância finalizada e encaminhada ao MPF e ao juízo, nenhuma providência foi tomada oficialmente. Por isso, a decisão de se instaurar um inquérito, no início de 2017, causa estranheza.
Mais ainda quando se recorda que o segundo grampo instalado ilegalmente no chamado fumódromo da SR/DPF/PR, que o agente Werlang disse ter colocado por ordem da chefe do Núcleo de Inteligência Policial (NIP), a delegada Daniele Gossenheimer Rodrigues – esposa do DPF Igor – ainda que possa ser considerado crime, jamais resultou em inquérito. Gerou apenas um Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD), com a suspensão temporária dos dois.
Mas, levando-se em conta que o governo que assumiu com o golpe do impeachment e vem dando cargos e foro privilegiado aos “deletados” e investigados pelos muitos “filhotes” que a Lava Jato gerou, as peças podem se encaixar. Demonstram que dentro do DPF também jogam no sentido de esvaziar a Operação depois dela ter impulsionado a derrubada de um governo legitimamente eleito, provocado a derrocada de um partido político (PT) e até mesmo contribuído, ainda que indiretamente, com o AVC que vitimou Marisa Letícia Lula da Silva.
Essa movimentação, frise-se, acontece justamente quando surgem nas delações os nomes dos peemedebistas que se aboletaram no Palácio do Planalto com o golpe do impeachment, e também os de diversos tucanos, em uma demonstração de que a corrupção que todos atribuíam exclusivamente aos petistas não se iniciou com eles. Afinal, o próprio ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deixou isso claro, como expusemos em FHC diz a Moro, tal como Lula tem dito, que “não sabia”, ao depor, na quinta-feira (09/02) perante o juiz Moro e falar sobre delações que indicam corrupção na Petrobras na sua gestão:
“Pode ter havido. O presidente da República não sabe tudo o que acontece”.
No entendimento de uma das boas fontes do Blog, a mudança de posição do DPF autorizando a instauração do IPL 01/2017, mostra apenas que no atual governo o jogo é praticado por quem conhece bem o terreno onde pisa, ao contrário do governo de Dilma Rousseff, cujos ministros da Justiça – tanto José Eduardo Cardoso, como Eugênio Aragão, ainda que por motivos diversos e talvez justificáveis – jamais cobraram para valer um posicionamento do mesmo Daiello;
“Eles estão esvaziando a Lava Jato por dentro e pegando os delegados que a tocaram e agindo com terror contra eles, para não ousarem abrir o bico. Esses policiais deram uma de espertalhões só que se meteram com espertalhões mais ousados do que eles”.
O diretor-gerasl do DPF, Leandro Daiello, acabou ganhando o manto protetor costurado pela Força Tarefa da Lava Jato – Foto: reprodução
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Envolvimento de muitos – Daiello, como já alertamos anteriormente, beneficiou-se da Operação Lava Jato para permanecer no cargo durante o governo petista. Ninguém ouso mexer com ele para não provocar a ira de parte da população que, bem manipulada pela mídia tradicional – ou familiar, como preferem alguns – endeusou rapidamente Moro e a Força Tarefa da Lava Jato. Atualmente, ele pode estar se beneficiando do trabalho profissional dos delegados Junqueira e Magno com outros objetivos. Dentro do DPF cresce o movimento pela sua substituição. Da mesma forma, ali muitos sabem que seu sonho dourado é se tornar adido policial no exterior, preferencialmente em um dos países da União Europeia. Com Aragão, ele quase foi mandado para a embaixada brasileira em Lisboa.
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Apesar de apenas três delegados terem impetrado a Ação de Conhecimento para acesso à Sindicância 04/2015, o número de possíveis envolvidos no IPL 01/2017 é maior. Uma primeira sindicância – 04/2014 -, presidida pelo delegado Mauricio Moscardi Grillo, também de Curitiba, concluiu que o grampo estava inativo, como dissemos acima. Mas o trabalho de Moscardi jamais mereceu crédito por muitos policiais, como o Blog informa desde a primeira matéria a respeito, em agosto de 2015: Lava Jato revolve lamaçal na PF-PR.
Na Ação de Conhecimento (lei a íntegra abaixo) os três delegados admitem terem sido ouvidos como suspeitos. Da mesma forma como ocorreu com Werlang – o primeiro que Magno ouvirá nessa segunda-feira. Mas, há mais delegados envolvidos. A começar pelo superintendente regional, Rosalvo Ferreira Franco que, como consta da confissão de Werlang (cuja íntegra está na matéria Lava Jato revolve lamaçal na PF-PR) acompanhava Igor de Paulo e Márcio Adriano, quando estes lhes deram a ordem de instalação do grampo.
Como a reportagem – “Surgem os áudios da cela do Youssef:…” – mostrou, o aparelho instalado na cela de Youssef gravou mais de 100 horas de conversas desmentindo a sindicância presidida por Moscardi
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Esta conversa também foi assistida pelo agente de Polícia Federal André Luiz Zanotto, na época respondendo pelo NIP, por conta de uma licença de saúde da delegada Daniele. Ele também não se opôs à ilegalidade. Verdade que tanto Werlang como Zanotto podem alegar que não era hábito questionarem a autorização judicial ao receberem ordens de instalação de escuta. Confiavam na chefia. Damey só foi saber que aquele grampo era ilegal quando Youssef o descobriu. Mas os dois, Werlang e Zanotto, prestaram falso testemunho na Sindicância comandada por Moscardi. Como de resto, todos os que o delegado ouviu, incluindo o agente Paulo Romildo, o “Bolacha” que na função de carcereiro retirou os presos das celas para que não testemunhassem a instalação indevida.
Werlang ainda preparou um laudo alegando que o aparelho que Youssef retirou do foro da cela e lhe foi repassado para uma análise técnica, não estava em condições de uso. Uma meia verdade. Não estava em condições do jeito em que recebeu (sem fonte de energia, e com outros pequenos defeitos), mas enquanto instalado, captava todas as conversas.
O próprio Moscardi, provavelmente, sabia que o grampo existiu e era ilegal. Afinal, ao alegar que aquela escuta deveria ser da época em que o traficante Fernandinho Beira-Mar esteve na custódia, esbarrou em uma questão técnica: o aparelho instalado na cela do doleiro só chegou a Curitiba, como mostram documentos da Diretoria de Inteligência Policial (DIP) do DPF, em Brasília, após o retorno do traficante para o presídio de Campo Grande (MS).
Já a delegada Érika, se o presidente do inquérito seguir a lei ao pé da letra, responderá como coautora do crime pois, segundo o que disse Werlang, era quem, juntamente com Márcio Anselmo, recebia os áudios da escuta ilegal para usar, ainda que informalmente, as conversas gravadas nas apurações da Operação Lava Jato. Lembre-se aqui o que Antônio Augusto Lopes Figueiredo Bastos, advogado do doleiro admitiu. Youssef teve fortes indícios de que suas conversas na custódia com os outros presos chegavam ao conhecimento dos delegados:
“Tivemos alguns indícios disso sim, Houve indícios, isso não tem dúvida. Mas, não em interrogatórios. Em conversas assim… que não tem como serem recuperadas. Eles nunca interrogaram diretamente sobre isso, mas os assuntos acabavam sendo abordados pelos delegados”, explicou, ao ser ouvido, em junho de 2015, como conta da reportagem Lava Jato revolve lamaçal na PF-PR.
Curioso é que diante de todas estas evidências que devem levar ao indiciamento dos delegados da Lava Jato, Márcio Anselmo esteja cogitando de ser corregedor da Superintendência do DPF no Espírito Santo, hoje comandada pelo delegado Luciano Flores de Lima.
O DPF Luciano Flores que levou coercitivamente Lula para depor e manteve a gravação ilegal da conversa do ex-presidente com a presidente Dilma Rousseff, hoje é superintendente do DPF no Espírito Santo e quer levar Márcio Anselmo como Corregedor. Foto – Reprodução TV Globo
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Para quem não se recorda, ele, embora lotado no Rio Grande do Sul, atuou na Lava Jato em Curitiba – fazendo jus a diárias – e foi o responsável pela gravação ilegal da conversa telefônica entre Lula e a presidente Dilma Rousseff, em março do ano passado, conforme noticiamos em Explicações para grampo de Lula e Dilma são sofismas, como também pela condução coercitiva de Lula para depor. Na citada reportagem afirmamos:
“Ele (o grampo) foi feito 1 hora e 48 minutos após o delegado da PF Luciano Flores de Lima ter sido comunicado, pela secretária da 13ª Vara Federal, às 11h44min, da decisão do juiz suspendendo o grampo. A conversa telefônica de Dilma e Lula ocorreu às 13h32min. O delegado poderia ter evitado a gravação. mas não o fez”.
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