02-03-2017, 9h46
Vazamentos da Lava Jato prejudicam país e desmoralizam Justica, MP e políticos
KENNEDY ALENCAR
BRASÍLIA
O depoimento de Marcelo Odebrecht dado ontem Curitiba teve um quantidade de vazamentos que desmoraliza de vez o segredo das colaborações premiadas. Desmoraliza uma série de autoridades da Justiça, do Ministério Público, do governo Temer, da administração Dilma e também o presidente do PSDB, o senador Aécio Neves (MG).
Prejudica a Lava Jato, porque mostra mais uma vez como a investigação, que é importante pelo combate à corrupção, mas também se presta a manipulações e vazamentos seletivos, apesar da ordem expressa do procurador-geral da República de manter em segredo os depoimentos dados ao processo no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) contra a chapa Dilma-Temer.
Prejudica o país, reforçando a imagem de uma república de bananas em que até na Lava Jato não há respeito à lei, manipulada para causar danos a políticos. Fere o direito de defesa dos acusados, que sofrem desgastes com vazamentos e não podem respondê-los oficialmente no âmbito dos processos. Prejudica a economia, gerando incertezas políticas que afetam expectativas do empresariado.
Em resumo, é muito ruim para o Brasil. O segredo, no caso das delações da Odebrecht, não faz mais nenhum sentido.
Repetindo: havia pedido expresso do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para que o sigilo dos depoimentos de Marcelo Odebrecht e de outros delatores ao TSE permanecessem em sigilo, pois o ministro relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, Edson Fachin, não quebrou o segredo das colaborações. Mas houve um festival de vazamentos. Melhor que o depoimento de ontem tivesse sido divulgado e que todas as delações da Odebrecht se tornassem públicas.
Para economia, o efeito é péssimo. O país não pode ter a Lava Jato como tema único, porque há graves problemas na economia, na saúde, na educação, na segurança pública e em outras áreas que mereceriam destaque no debate público.
Uma Lava Jato que virou um circo de delações gera tremenda incerteza no mercado financeiro e nos empresários que precisam tomar decisões de investimento.
Agora, surgiram dúvidas sobre a capacidade do governo de aprovar as reformas da Previdência e trabalhista no Congresso. O país tem quase13 milhões de desempregados, a renda está em queda, a recessão é grave. Havia expectativa de melhora econômica que perde força com uma investigação realizada dessa forma.
É muito bonito e conveniente dizer que a Lava Jato não é a causa, mas o remédio para nossos males, como repetem à exaustão procuradores da República. Mas ela tem gerado incertezas políticas e jurídicas que afetam a vida real das pessoas do ponto de vista econômico. Investigar destruindo empresas não é de interesse público. Punir corruptos e corruptores, sim.
Repetindo de novo: ótimo que a Lava Jato combata a corrupção. Mas não pode investigar assim, vazando depoimentos que o procurador-geral da República e que o ministro relator do caso no Supremo Tribunal Federal, Edson Fachin, querem que fiquem em segredo. Já passou da hora de tornar públicas as delações da Odebrecht. Esse sigilo só tem feito mal ao país e bem aos que manipulam os vazamentos.
Ontem, de acordo com relatos da imprensa, Marcelo Odebrecht disse que não tratou de valores com o presidente Michel Temer no jantar de 2014 no Palácio do Jaburu. Segundo o vazamento, Marcelo Odebrecht disse que outro delator da empresa, Cláudio Melo, teria tratado do valor com Padilha. Ora, tem uma contradição entre Marcelo Odebrecht e Cláudio Melo. Há uma imprecisão ou uma mentira. Se Marcelo Odebrecht tem razão, isso preserva Temer e enfraquece ainda mais Eliseu Padilha, que dificilmente voltará à Casa Civil. Se Cláudio Melo estiver certo, isso prejudica mais o presidente da República.
Não dá para uma investigação de corrupção ser conduzida dessa maneira. Ela vai criar as tais nulidades que a defesa de Temer pretende alegar. Marcelo Odebrecht também fez revelações em relação ao ex-ministro da Fazenda Guido Mantega e ao presidente do PSDB, o senador Aécio Neves. Nos dois casos, diz que repassou recursos.
Ora, é preciso acelerar todas as investigações. Mas o que se vê é celeridade em relação a petistas e demora no que se refere a tucanos. Se for verdade o que ele diz, Mantega tem sérios problemas a responder. Afinal, a acusação é que um ministro da Fazenda negociava propinas.
E Aécio, que é do partido que pede a cassação da chapa Dilma-Temer no TSE, fica numa situação política delicada, com a suspeita da hipocrisia de ter abusado do poder econômico que critica no PT e de ter usado um operador para obter recursos da Odebrecht exatamente como fizeram petistas e peemedebistas.
Não faz nenhum sentido a afirmação de Marcelo Odebrecht, de acordo com o que vazou, de que ele não seria o dono do Brasil, mas o bobo da corte.
Ele não era o bobo corte, mas um dos maiores corruptores da corte. Era um empresário que atuava com agressividade, segundo relatos de diversas autoridades que estiveram com ele. Um empresário que montou um departamento secreto de operações estruturadas, que, no fundo, era a seção para documentar as propinas, mostra a arrogância com a qual atuava.
Se entrou em projetos obrigado, entrou pela expectativa de retorno. A Odebrecht cresceu muito no período em que Marcelo Odebrecht a comandou. Posar de vítima enquanto atuava como corruptor é querer fazer o país inteiro de bobo e tentar suavizar a sua situação.
Na Lava Jato, corruptores estão se dando melhor do que os corruptos, negociando penas baixas e mantendo boa parte de suas fortunas. Mas esses corruptores e corruptos são irmãos siameses no cometimento de crimes.
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Em delação de Odebrecht, vaza-se trecho que tenta inocentar Temer
qui, 02/03/2017 – 11:08
Atualizado em 02/03/2017 – 11:22
Jornal GGN – A delação de mais de três horas de Marcelo Odebrecht, em caráter sigiloso, teve alguns de seus trechos divulgados pela imprensa, por meio de informações de fontes presentes na audiência. Entre as divulgações, o Estadão selecionou a de que o presidente Michel Temer (PMDB) “nunca” teria pedido dinheiro diretamente ao empreiteiro.
A expectativa sobre o depoimento de Marcelo, ex-presidente da companhia que leva o sobrenome da família, era de que o atual presidente seria atingido em cheio. Isso porque o ministro-corregedor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Herman Benjamin, convocou três delatores da Odebrecht que abordaram repasses ao PMDB. Entre eles, Marcelo.
Na audiência com o ministro relator dos processos de cassação da chapa Dilma Rousseff e Michel Temer, o empresário teria confirmado a informação de que ocorreu um jantar, a pedido do atual presidente, à época no Palácio do Jaburu, com peemedebistas em 2014.
No período, confirmou que o ex-diretor de Relações Institucionais da empreiteira, Claudio Melo Filho, ligou para ele e conversou sobre a doação da empreiteira para o grupo de Temer e para apoiar aliados do peemedebista. O ex-diretor teria dito a Marcelo que Eliseu Padilha, atual ministro licenciado da Casa Civil do governo, teria solicitado o montante.
Mas, por outro lado, respondeu ao questionamento dos investigadores e do ministro Herman se Michel Temer foi quem pediu o dinheiro no tal encontro. Sobre essa pergunta específica, Marcelo Odebrecht disse que “não se lembra de Temer ter solicitado R$ 10 milhões” diretamente a ele. O que motivou a manchete do Estadão: “Odebrecht diz que Temer não lhe pediu dinheiro”.
Entretanto, ainda que não citando diretamente o suposto pedido feito por Temer, confirmou que o encontro no Palácio do Jaburu foi promovido pelo então vice-presidente e que Eliseu Padilha teria pedido os repasses para apoio da Odebrecht ao PMDB.
Quando conversou com Melo Filho, disse a ele para que o ex-diretor consultasse empresários da companhia para levantar os repasses. Em resposta, o executivo, que também é delator e narrou o caso específico com mais detalhes à Lava Jato, afirmou que arrecadou R$ 10 milhões, sendo destes apenas R$ 6 milhões ao então presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Paulo Skaf. A concretização do montante teria ocorrido no jantar do Jaburu.
A informação é, originalmente, do ex-diretor de Relações Institucionais da empreiteira, Claudio Melo Filho. Marcelo narrou o que conversou com o executivo à época. E sobre esse episódio, apenas disse que Temer não pediu diretamente dinheiro a ele.
Em resposta, Michel Temer disse que “pediu auxílio formal e oficial à Construtora Norberto Odebrecht”, mas que “não autorizou, nem solicitou que nada fosse feito sem aparo nas regras da Lei Eleitoral” e disse que a quantia total de R$ 11,3 milhões ao PMDB, em 2014, foi declarado ao TSE.
Por outro lado, trouxe mais informações do que a cena de jantar em que o grupo político de Temer recebeu, segundo sua confirmação, os R$ 10 milhões. Afirmou a Herman Benjamin que 4/5, ou seja, 80% das doações de um total de R$ 150 milhões para a campanha foram realizadas via caixa 2.
Isso significa que R$ 120 milhões foram repassados pela Odebrecht, segundo as informações da delação de Marcelo nesta quarta-feira (01), via caixa dois à chapa Dilma e Temer. O ex-presidente da empreiteira disse que é impossível algum partido ser eleito sem esse tipo de expediente.
O executivo afirmou que a prática de caixa dois é algo “natural” nas campanhas, defendeu também a legalização do lobby e deixou claro que a Odebrecht não é a única a usar as doações, com repasses, para conquistar o apoio político do governo em questão.
Delação em partes
Em outras acusações que foram vazadas, pelo Estadão, Marcelo teria narrado pedidos de dois ministros do PT, Antônio Palocci e Guido Mantega para contribuir com as campanhas políticas. Mantega teria pedido R$ 50 milhões, ainda em 2011, como contrapartida na campanha de 2014 de Dilma.
Marcelo também narrou que Palocci o procurou, em 2008, para a Odebrecht realizar os pagamentos ao publicitário João Santana, nas campanhas de 2006 do ex-presidente Lula e de 2010 e 2014 de Dilma. O ex-presidente da empreiteira encaminhava os pedidos ao ex-dirigente da Odebrecht, Hilberto Silva, responsável pelo chamado “setor de propinas” da empresa.
Em resposta, a defesa de Dilma afirmou: “Não temos nada a temer, porque temos o compromisso com a verdade”. Disse que não há surpresas na decisão do TSE de ouvir os empresários e que “todos aqueles que fizeram delação premiada, já foram ouvidos no processo”.
“É do interesse tanto da defesa de Dilma Rousseff, quanto da Justiça Eleitoral, que a verdade seja trazida aos autos, demonstrando a lisura do processo eleitoral. A posição da defesa da presidenta tem sido a de colaboração com a Justiça Eleitoral. Foi assim, por exemplo, quando demonstramos, por documentos, que o empresário Otávio Azevedo, da Andrade Gutierrez, havia mentido em seu depoimento ao TSE”, concluiu o advogado de Dilma, Flávio Caetano.
Outras delações
Ainda serão ouvidos por Herman Benjamin os ex-funcionários e delatores Cláudio Melo Filho e Alexandrino de Salles Ramos. O primeiro é ex-vice-presidente de Relações Institucionais da empreiteira e, em delação à Procuradoria-Geral da República, informou a remessa de, pelo menos, R$ 10 milhões da companhia às campanhas peemedebistas de 2014.
Foi Cláudio Melo Filho que detalhou os pedidos do PMDB, de Eliseu Padilha e de Michel Temer à companhia Odebrecht, como caixa dois, para financiar as campanhas peemedebistas. O desfecho desta ação poderá encurtar o mandato de Michel Temer.
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