247 – Juízes que conduzem os processos da Operação Lava Jato vêm usando com frequência uma doutrina jurídica estrangeira para fundamentar condenações pelo crime de lavagem de dinheiro nos casos em que as provas apresentadas contra os acusados parecem mais frágeis.
Conhecida como teoria da cegueira deliberada e formulada pela primeira vez na Inglaterra no século 19, essa doutrina permite tratar como culpada uma pessoa que tenha movimentado dinheiro sujo sem ter conhecimento da natureza ilícita dos recursos, punindo-a com o mesmo rigor aplicado a quem comete esse crime conscientemente.
Desde o início da Lava Jato, há três anos, o juiz Sergio Moro, responsável pelos processos que estão em Curitiba, e seu colega Marcelo Bretas, que atua no Rio, condenaram 121 pessoas por lavagem de dinheiro. Eles recorreram à doutrina importada em 13 casos até agora, conforme levantamento feito pela Folha.
Ao julgar essas ações, os juízes reconheceram que não havia provas de que os réus soubessem da ligação entre o dinheiro movimentado e a corrupção, mas os condenaram mesmo assim, argumentando que tinham motivo para suspeitar do que estavam fazendo e tinham consciência do risco de cometer crimes.
A legislação brasileira pune a lavagem de dinheiro quando o acusado sabe que o dinheiro é sujo e age com intenção de escondê-lo.
As informações são de reportagem de Ricardo Balthazar na Folha de S.Paulo.
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DESEQUILÍBRIO
Em suas sentenças, Moro tem citado a seu favor opiniões de integrantes do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e de três ministros do Supremo Tribunal Federal que mencionaram a doutrina no julgamento do mensalão, Celso de Mello, Luiz Fux e Rosa Weber –que era assessorada por Moro nessa época.
“A teoria da cegueira deliberada desequilibra a balança da Justiça em favor da acusação, porque estreita o caminho para a defesa”, diz o advogado Spencer Toth Sydow, autor de um livro sobre a doutrina e contrário à maneira como tem sido adotada no país. “Com ela, o acusado não pode alegar ignorância, e o Estado não precisa buscar prova.”
Em pelo menos duas ocasiões, Moro absolveu pessoas acusadas de lavagem de dinheiro pelo Ministério Público argumentando que a teoria da cegueira deliberada não era aplicável em seus casos.
Ele fez isso ao julgar três funcionários da OAS envolvidos com as obras do apartamento que a empreiteira diz ter reformado para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e executivos da Engevix que assinaram contratos com o doleiro Alberto Youssef.
Para o juiz, nesses casos os acusados estavam apenas cumprindo ordens superiores, e não havia provas de que soubessem da origem ilegal dos recursos que movimentaram.
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Dentre os réus acusados com base na teoria da ‘cegueira deliberada’ estão o casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura, ambos condenados por ter recebido US$ 4,5 milhões de um fornecedor da Petrobras na Suíça, mas disseram ignorar a origem ilícita dos recursos.
Na sentença, Moro disse que “a postura de não querer saber e a de não querer perguntar caracterizam ignorância deliberada e revelam a representação da elevada probabilidade de que os valores tinham origem criminosa e a vontade de realizar a conduta de ocultação e dissimulação a despeito disso”.
Como se vê, tal ‘cegueira deliberada’ abusa da hermenêutica ao interpretar o Código Penal Brasileiro à luz de teoria estrangeira, portanto, constituindo-se em abuso de autoridade dos juízes que não observam os princípios do contraditório e da ampla defesa previstos na Constituição Federal do Brasil de 1988.
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Moro não usou esta teoria para condenar Claudia Cruz (mulher do cunha) e a filha do Cunha