Helena Chagas: crise do Mais Médicos é mais grave já gerada por Bolsonaro
A jornalista Helena Chagas destaca que ‘será a duras penas que o presidente eleito Jair Bolsonaro aprenderá a diferença entre o discurso fácil de campanha e a responsabilidade pelos atos de governo’ e que ” episódio que levará à retirada de quase nove mil médicos cubanos do país é, sem dúvida, a mais grave consequência de sua incontinência verbal”; ela ressalta que os médicos cubanos atendem os mais distantes grotões do país e que ‘chegaram para preencher vagas nas unidades básicas de saúde que os médicos brasileiros não quiseram ocupar’.
15 de Novembro de 2018 às 09:47
247 – A jornalista Helena Chagas destaca que “será a duras penas que o presidente eleito Jair Bolsonaro aprenderá a diferença entre o discurso fácil de campanha e a responsabilidade pelos atos de governo. Depois da confusão sobre a transferência da embaixada brasileira em Israel, que colocou em risco nosso pujante comércio com os países árabes, e outros vaivéns, o episódio que levará à retirada de quase nove mil médicos cubanos do país é, sem dúvida, a mais grave consequência de sua incontinência verbal”.
Para ela, a situação é “grave e vai além de qualquer ideologia ou troca de desaforos internacionais”, pois retira o “atendimento médico a milhões de brasileiros que vivem nas periferias das grandes cidades e nos grotões do interior”. “Os médicos cubanos não vieram parar aqui por acaso, nem por uma irresistível afinidade ideológica com o governo do PT. Aqui chegaram para preencher vagas nas unidades básicas de saúde que os médicos brasileiros não quiseram ocupar.É bom lembrar: o primeiro ato do programa Mais Médicos foi oferecer esses empregos a médicos brasileiros. Poucos se interessaram, e déficit na relação medico-pacientes no Brasil continuou enorme até a chegada dos cubanos. Ainda é grande, mas se você fizer uma pesquisa junto aos pacientes da periferia verá que eles preferem ter os médicos cubanos do que médico algum.
A decisão de Cuba, provocada pelas palavras do novo presidente brasileiro e pelas exigências anunciadas pelo novo governo, deve representar, de quebra, o fim do Mais Médicos. Os brasileiros não vão preencher essas vagas. Outros estrangeiros serão desencorajados pela necessidade de fazer o Revalida, principal obstáculo ao exercício da medicina aqui por médicos formados no exterior.
Só para lembrar: o STF julgou legal o programa Mais Médicos quando as corporações médicas brasileiras contra ele recorreram, autorizando a dispensa da validação do diploma no acordo fechado com Cuba em julgo de 2013, intermediado pela Opas.
Destruir é fácil. Faz-se num instante. Difícil será construir uma solução para milhões de pacientes. E não falamos sequer do problema diplomático que se avizinha, com o convite de Jair Bolsonaro aos médicos cubanos que não querem deixar o país. Poucas vezes viu-se oferecimento tão claro e desabrido de refúgio ou asilo internacional nesse tipo de circunstâncias.”
Leia a íntegra em Os Divergentes.
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Saída de cubanos do Mais Médicos deixa 24 milhões de brasileiros sem atendimento
Saída dos profissionais cubanos do programa Mais Médicos em reação às declarações feitas pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), que estabeleceu uma série de condições para a atuação dos médicos cubanos no país, deverá deixar cerca de 24 milhões de brasileiros sem nenhum tipo de assistência à saúde; para garantir a cobertura integral no Programa Saúde da Família, o Governo brasileiro terá que contratar quase 10 mil médicos em poucos meses, o que aumenta a pressão feita por prefeituras de todo país por uma resposta rápida quanto ao futuro do programa.
15 de Novembro de 2018 às 11:19
247 – A saída dos profissionais cubanos do programa Mais Médicos em reação às declarações feitas pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), que estabeleceu uma série de condições para a atuação dos médicos cubanos no país, deverá deixar cerca de 24 milhões de brasileiros sem nenhum tipo de assistência à saúde. A situação deverá criar uma pressão sobre o Ministério da Saúde tanto por parte dos que ficarão desassistidos como por parte das prefeituras de todo o país.
“A decisão, que preocupa representantes das prefeituras de todo o país, deixará um buraco de 8.332 vagas em aberto, que se somam a outras 1.600 que já estavam ociosas, segundo o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems). As regiões que deverão ser mais afetadas são justamente as mais vulneráveis: Norte, Nordeste e periferias das grandes cidades. Ainda não se sabe exatamente quando os médicos cubanos deixarão o país, mas os profissionais só deverão ficar, no máximo, até o fim do Governo de Michel Temer, em dezembro”, destaca matéria do jornal El País.
Pouco após o anúncio feito pelo governo cubano de que Havana irá retirar seus médicos do programa, ainda na quarta-feira, o Ministério da Saúde se apressou em afirmar que “nos próximos dias lançará um edital para a contratação de médicos brasileiros que queiram ocupar as vagas de cubanos”, com prioridade para “brasileiros formados no Brasil, seguida de brasileiros formados no exterior, médicos intercambistas e estrangeiros. Um outro edital, este para a contratação de profissionais para 1,6 mil unidades de saúde, já havia sido prometido pelo Governo Federal diante da pressão exercida pelas prefeituras. “Isso significa que, para garantir a cobertura integral no Programa Saúde da Família, o Governo brasileiro terá que contratar quase 10 mil médicos em poucos meses”, destaca a reportagem.
Bolsonaro, que havia colocado em dúvida a qualificação dos médicos cubanos, reagiu afirmando que a “decisão unilateral” tomada por Havana foi uma “irresponsabilidade”. Segundo ele, as vagas passarão a ser abertas a profissionais brasileiros e que “o programa não está suspenso. Médicos de outros países podem vir para cá. A partir de janeiro, pretendemos dar uma satisfação a essas populações que ficarão desassistidas.
O El País destaca, ainda, que o “o Programa Mais Médicos, implementado durante o governo da ex-presidenta Dilma Rousseff (PT) em 2013, foi um dos alvos de polarização política durante as últimas eleições. Foi implementado há cinco anos para que os profissionais cubanos ocupassem as vagas não cobertas pelos médicos brasileiros, geralmente em zonas mais isoladas e pobres. “Nesses cinco anos de trabalho, cerca de 20 mil colaboradores cubanos atenderam a 113.359.000 pacientes em mais de 3.600 municípios”.
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Frente Nacional de Prefeitos e secretários de Saúde temem “perda cruel” e “retrocesso” no atendimento à população sem os profissionais de Cuba; regime da ilha cancelou convênio ao rejeitar exigências do novo governo
A Frente Nacional de Prefeitos (FNP) e o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) divulgaram nota conjunta para cobrar a “revisão do posicionamento” do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), a respeito da participação de profissionais cubanos no programa Mais Médicos. O regime de Cuba anunciou nessa sexta-feira (14) que não iria se submeter às exigências do novo governo e que, desse modo, cancelaria o convênio para enviar médicos ao Brasil .
Prefeitos e secretários se dirigem diretamente ao governo recém-eleito ao alertar que há “iminentes e irreparáveis prejuízos à saúde da população, inclusive para a parcela que não é atendida pelo Mais Médicos ” caso seja efetivada a saída dos cubanos. “Sendo assim, as entidades pedem a revisão do posicionamento do novo Governo, que sinalizou mudanças drásticas nas regras do programa, o que foi determinante para a decisão do governo de Cuba.”
É sugerido que as condições atuais do programa, renovadas em 2016 pelo governo Michel Temer (MDB), sejam mantidas em caráter emergencial. “O cancelamento abrupto dos contratos em vigor representará perda cruel para toda a população, especialmente para os mais pobres. Não podemos abrir mão do princípio constitucional da universalização do direito à saúde, nem compactuar com esse retrocesso“, diz a nota.
A FNP e o Conasems disseram lamentar a interrupção do acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), que faz a intermediação do programa com o governo de Cuba, e alertaram para o risco de mais de 29 milhões de brasileiros não terem mais acesso a atendimento de Saúde.
Atualmente, cerca de 8.500 médicos cubanos prestam serviços no Brasil, o que representa mais de a metade dos profissionais que fazem parte do programa de atendimento lançado em 2013, durante o governo Dilma Rousseff (PT).
Segundo a FNP e Conasems, a “rescisão repentina” do acordo com Cuba trará “cenário desastroso” a 3.243 municípios do Brasil. As entidades citam que 79,5% das cidades brasileiras contam somente com profissional do Mais Médicos e acrescentam que 90% dos atendimentos da população indígena são feitos por profissionais de Cuba.
Também é citado que 85% dos usuários afirmam que a assistência em saúde melhorou com o programa. “A interrupção abrupta da cooperação com o governo de Cuba impactará negativamente no sistema de saúde, aumentando as demandas por atendimentos nas redes de média e alta complexidade, além de agravar as desigualdades regionais“, alertam prefeitos e secretários.
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Bolsonaro troca mais médicos por mais doentes
Cinco anos depois de terem desembarcado no país, como força principal do programa Mais Médicos, os médicos cubanos iniciam o caminho de volta a seu país. Criando exigências artificiais para sua permanência no país, Jair Bolsonaro criou uma situação insustentável para o governo cubano. Hoje, o Ministério da Saúde de Cuba anunciou que os médicos do país irão retirar-se do Brasil.
Você pode ter a opinião que quiser sobre o regime cubano e também pode criticar o tratamento que os médicos daquele país recebem quando se deslocam para o estrangeiro. Eles não recebem o salário integral pago pelo governo brasileiro. Também não têm direito a mudar-se para cá com suas famílias.
O ponto fundamental aqui é outro. Trata-se do prejuízo que essa decisão, forçada por Bolsonaro, que sequer tomou posse, irá causar para a maioria da população, em especial das famílias mais pobres, de cidades mais distantes. Nas cidades com menos de 10 000 habitantes, mais pobres, menos equipadas, o Mais Médicos recebiam por 48% do atendimento básico.
Atingindo 63 milhões de brasileiros, o programa conseguia combater doenças na fase inicial, evitando tratamentos caros e desnecessários — além de poupar vidas.
Em 2014, no último levantamento disponível, dos 14.900 médicos envolvidos no programa, nada menos que 11.400 eram cubanos.
Só para você ter ideia da avaliação desse trabalho, um projeto do governo Dilma, lançado em 2013, ano em que a população dizia que queria uma saúde “padrão FIFA” em imensos protestos realizados no país inteiro: Num levantamento feito em 2017, junto a 14.000 pessoas em 700 municípios, 94% dos entrevistados se disseram muito satisfeitos ou satisfeitos com o atendimento recebido — de graça, sem tirar um tostão do bolso.
Essa aprovação reflete o saldo positivo de uma transição na saúde pública brasileira. Historicamente destinada a atender as camadas mais endinheiradas da população, o atendimento médico sempre esteve disponível — para quem podia pagar –, nos grandes centros. Enquanto isso, 15% dos municípios não dispunham de um único médico. Outros 2 000 possuíam 1 para cada 3000 habitantes — o padrão da Organização Mundial de Saúde é de 1 para cada 2 000. A partir do Mais Médicos, surgiram 5.306 novas vagas, em sua maioria nestes locais, em oferecendo residência em especialidades ligadas a saúde pública.
Em seu desembarque, os primeiros médicos cubanos foram recebidos com agressividade e manifestações repulsivas — inclusive cusparadas em aeroporto — por lideranças das corporações médicas, mobilizadas na defesa de um modelo privado e excludente de medicina. Cinco anos depois, essa é a plateia que Bolsonaro procura agradar ao fazer exigências consideradas inaceitáveis pelo governo cubano, embaladas por um discurso supostamente humanitário, que teria 0,1% de credibilidade demonstrasse a mesma preocupação com a população que será prejudicada.
Para o novo presidente, o ataque ao principal núcleo profissional do Mais Médicos, com uma experiência elogiada pelos principais organismos internacionais, inclusive a Organização Mundial de Saúde, obedece a um objetivo político óbvio. Eliminar todo vestígio das conquistas e benefícios deixados pelos governos Lula e Dilma.
É bom reconhecer que nem tudo foi nem será perdido. Os novos cursos de medicina prosseguem, novos profissionais seguirão sendo formados.
Para a população atingida, o efeito é uma derrota da cidadania.. Sem os profissionais que até aqui foram a alma do programa, o país vai assistir ao retorno do modelo antigo da medicina como mercadoria e não como direito, no qual o atendimento médico é um favor acessível a poucos, oferecido e barganhado num universo de clientelismo e apadrinhamento que marca o pior do sistema político brasileiro.
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Cidade do Paraná que deu 74% dos votos a Bolsonaro perde 75% dos médicos
A ingratidão do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), que implantou programa ‘Menos Médicos‘, expulsando os médicos cubanos do país, foi proporcional ao número de votos que ele recebeu no próspero município de Ponta Grossa (PR).
Na eleição de outubro, Bolsonaro obteve 74% dos votos válidos (137.776) entre os pontagrossenses e — como recompensa — os moradores da cidade perderam 75% dos médicos das unidades de saúde.
“Sem dúvida, este é o problema mais grave em todo o meu governo”, reconheceu o prefeito Marcelo Rangel (PSDB).
Dos 80 médicos que atendem nas unidades de saúde de Ponta Grossa, 60 deles eram cubanos do programa Mais Médicos.
Segundo o prefeito tucano, o programa ‘Menos Médico’ do presidente eleito afetará diretamente 240 mil pessoas no município.
Ponta Grossa fica a 110 km de Curitiba, na região dos Campos Gerais, e possui 350 mil habitantes.