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Cumplicidade no STF: A visível piscada de Moraes na sabatina para o STF, por José Roberto de Toledo

A visível piscada de Moraes na sabatina, por José Roberto de Toledo

 

Jornal GGN – A piscada de Alexandre de Moraes, prestes a ser sabatinado pelos senadores, para o presidente da comissão que iria analisar a sua entrada no Supremo Tribunal Federal (STF), foi registrada em fotografia, que diz muito mais do que o simples gesto.

“Se aprovado – como viria a ser –, Moraes pode julgar vários daqueles senadores, a começar por Lobão, citado múltiplas vezes por delatores da Lava Jato. Aquela piscadela não denotava um ilícito, mas sua desenvoltura e cumplicidade reforçaram a conotação que já estava na cabeça de parte da opinião pública: ‘estão todos combinados’, ‘está tudo dominado'”, resumiu José Roberto de Toledo, em sua coluna publicada no dia da sabatina.

Ressaltando que não se trata de um coincidente clique do fotógrafo ou de interpretações preconceituosas que viriam, Toledo lembra que “vemos com os olhos, mas enxergamos com o cérebro e todos os seus vieses”. Nesse cenário de hipóteses, coincidências ou teorias, o que sobra, lembra o jornalista é um acúmulo de “fatos nada alternativos que sugerem outras qualidades que não o saber jurídico para Moraes estar ali, piscando para a alcateia”.

O título da coluna publicada no Estadão, “Não há aliens no Supremo”, guarda relação com uma de suas publicações no Twitter, ainda antes da veiculação do texto:

 

Por José Roberto de Toledo

Não há aliens no Supremo

O sabatinado voltou-se para o presidente da comissão, a seu lado, e perguntou sobre o andamento da sabatina. Ao ouvir a resposta, sorriu e piscou o olho esquerdo. O repórter Dida Sampaio seguia os movimentos da dupla com sua Canon EOS-1D X e imortalizou a cena. Pelos personagens flagrados e sua circunstância, a foto da piscada virou ícone do momento político e viralizou nas mídias sociais, assim que publicada pelo Estado.

 

Do Estadão

Em primeiro plano, o perfil do presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Edison Lobão (PMDB-MA), aparece propositalmente borrado. O foco está à sua frente, no personagem principal do dia, talvez do ano: ministro licenciado da Justiça, Alexandre de Moraes (ex-PMDB, ex-PFL e ex-PSDB) comprime os lábios, engolindo o sorriso, e cerra com força as pálpebras de um olho só, em sinal de aprovação. O cabelo tingido de um e a careca do outro realçam o contraste.

O gesto teatral de Moraes seria banal, não estivesse ele sendo sabatinado na CCJ para virar ministro do Supremo Tribunal Federal. Se aprovado – como viria a ser –, Moraes pode julgar vários daqueles senadores, a começar por Lobão, citado múltiplas vezes por delatores da Lava Jato. Aquela piscadela não denotava um ilícito, mas sua desenvoltura e cumplicidade reforçaram a conotação que já estava na cabeça de parte da opinião pública: “estão todos combinados”, “está tudo dominado”.

O preconceito está nos olhos de quem vê, dirão sabatinadores e sabatinado. E com razão: vemos com os olhos, mas enxergamos com o cérebro e todos os seus vieses. Nem tudo é viés de confirmação, porém. Acumulam-se fatos nada alternativos que sugerem outras qualidades que não o saber jurídico para Moraes estar ali, piscando para a alcateia.

Como chefe da polícia paulista, Moraes montou força-tarefa que identificou, prendeu e conseguiu a condenação em tempo recorde do chantagista que hackeou o celular da primeira-dama Marcela Temer e ameaçava “jogar na lama” o nome de seu marido. Promovido a ministro da Justiça e chefe da Polícia Federal, manteve-se bem informado sobre os passos da Lava Jato, como demonstrou ao dizer, em ato político, que haveria operação no dia seguinte.

Quando o avião em que estava Teori Zavascki deu seu mergulho fatal no mar de Paraty, Moraes posou ao lado de Temer enquanto o presidente fazia sua declaração de pesar pela morte do ministro do STF e relator da Lava Jato. Nas articulações que se seguiram para nomear o substituto, Moraes foi poupado do escrutínio dos primeiros dias pós-tragédia graças ao vazamento do nome de um boi de piranha que, por comparação, tornou o seu palatável.

Indicado por Temer, Moraes cabalou votos como o político que é. Visitou senadores e fez até sabatina informal com uma dúzia deles em uma chalana ancorada no lago Paranoá, conhecida em Brasília como “barco do amor” – pelo ambiente familiar.

Essas qualidades superaram o desempenho do ministro como gestor da já aparentemente esquecida crise nos presídios, e no combate às facções do crime organizado que ameaçam virar cartéis. Seu desempenho fez todos esquecerem que ele próprio defendia que políticos não devem ser nomeados para o Supremo.

A aprovação de Moraes sepulta o mito de que ministros do STF são aliens de Trappist-1, sem lado nem viés. Humanos, eles formam um tribunal que é alvo de lobbies empresariais e partidários, que sofre pressão da opinião pública e faz julgamentos políticos. É tão sujeito a crises quanto o resto da praça dos Três Poderes. Para a imagem do Supremo, a Lava Jato não será outro mensalão. Os vizinhos estão vibrando. Há tempos não se sentiam tão iguais.

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