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Jurista mais referenciado pelo STF, José Afonso da Silva, enviou parecer contra a prisão após a condenação em segunda instância; "Parecer foi feito sem cobrança de honorários por se tratar de um "dever impostergável" de "defesa da Constituição"

Maior constitucionalista brasileiro defende no STF a garantia de presunção de inocência de Lula

Em parecer, jurista critica a fala de Cármen Lúcia, sem mencioná-la, de que rever a prisão em segunda instância seria “apequenar” o Supremo. “A grandeza de um Tribunal não se perde quando, no cumprimento de sua missão constitucional, presta a jurisdição sem temor e sem concessão e não se sente apequenado pelo fato de rever sua posição em favor dos direitos fundamentais”
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Foto: Reprodução Youtube
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Jornal GGN – Um dos juristas mais referenciados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), José Afonso da Silva, enviou um parecer contra a prisão após a condenação em segunda instância, sobre o recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
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O parecer foi feito por consulta dos advogados do ex-presidente Lula, a partir de perguntas enviadas a Silva. Para ele, “o princípio ou garantia da presunção de inocência tem a extensão que lhe deu o inc. LVII do art. 5º da Constituição Federal, qual seja, até o trânsito em julgado da sentença condenatória. A execução da pena antes disso viola gravemente a Constituição num dos elementos fundamentais do Estado Democrático de Direito, que é um direito individual fundamental”.
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Professor titular aposentado pela Faculdade de Direito da USP, Afonso da Silva é o jurista mais citado pelos ministros da Suprema Corte sobre análises de controle abstrato da Constituição Federal. Ele explicou que o parecer foi feito sem cobrança de honorários por se tratar de um “dever impostergável” de “defesa da Constituição”.
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“Afirmei que tenho o ‘dever impostergável’ de defender a Constituição, e essa afirmativa decorre do fato de que trabalhei muito, me empenhei para além mesmo de minhas forças, para que ela fosse uma Constituição essencialmente voltada para a garantia da realização efetiva dos direitos humanos fundamentais, confiante em que os Tribunais, especialmente o Tribunal incumbido de sua guarda, soubessem interpretar a formulação normativa desses direitos, segundo a concepção de que seu entendimento há de ser sempre expansivo e nunca restritivo”, apontou.
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O parecer foi feito no formato de perguntas e respostas, gerando 63 pontos ressaltados e analisados pelo jurista. Em suma, as 27 páginas apontam que o Habeas Corpus ingressado pela defesa de Lula tem como base o artigo 5º, inciso LVII, da Constituição, que garante a presunção da inocência e proíbe a antecipação da pena, sem a existência de decisão condenatória contra a qual não seja mais possível recurso. Em outras palavras, contra sentenção em trânsito em julgado.
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Nesse sentido, lembrou que apesar de caber “criticar” os trechos da Constituição, “pode-se condená-lo, mas um texto de uma Constituição rígida tem que ser respeitado, principalmente pela instituição incumbida de guardá-lo e garantir sua eficácia e aplicabilidade na sua inteireza”.
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Também levantando situações já aventadas por ministros do STF, como a própria atual presidente Cármen Lúcia, de que rever a condenação em segunda instância seria “apequenar o Supremo”, Afonso da Silva disse que se trata de uma questão constitucional de repercussão geral, “significa que não é uma questão menor, de sorte que o Tribunal não se apequena revendo-a nos ditames da Constituição”.
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“A grandeza de um Tribunal não se perde quando, no cumprimento de sua missão constitucional, presta a jurisdição sem temor e sem concessão e não se sente apequenado pelo fato de rever sua posição em favor dos direitos fundamentais, a favor de quem quer que seja que lhe bata às portas. Um Tribunal só se diminui e perde credibilidade quando decide contra ela, qualquer que seja a motivação”, insistiu.
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“De fato, a presunção de inocência integra o constitucionalismo, desde sua implantação no Séc. XVIII, como sistema de limite ao poder, e, especificamente, como limite ao poder de imposição de penas do juiz. Como veremos, em seguida, originou-se das mesmas fontes políticas, sociológicas e filosóficas que fundamentaram a formação da jurisdição penal autônoma e independente, contemporânea, assim, do surgimento do direito penal garantístico”, completou.
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Remeteu a considerações de base do Direito Penal, como o signifcado da “culpabilidade” para entrar na questão que se refere ao processo contra Lula: “A culpabilidade é, assim, um elemento da estrutura conceitual do crime, é uma situação anterior, fase subjetiva, que se forma com a imputabilidade, a culpabilidade e a responsabilidade penal. Sem culpabilidade não há crime e, pois, nem condenação legítima. Logo, a culpabilidade é pressuposto da condenação. E assim está intrinsicamente dependente daquela. Se não existe culpabilidade, consequentemente não pode existir condenação e, menos ainda, aplicação de pena”.
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Assim, conclui que “fere o princípio da presunção de inocência admitir a prisão do condenado antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, porque isso significa considerá-lo culpado antes do trânsito em julgado. Então, é uma posição que fere a vedação constante do inc. LVII do art. 5º da Constituição. Do contrário seria admitir mudança de um dispositivo que integra as cláusulas pétreas da Constituição (art. 60, §4º, IV) por via de interpretação judicial”.
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